Novas tecnologia e relações de trabalho
Bullying e Ciberbulliyng – o empregador pode ser responsabilizado por atos de seus empregados? Qual o limite da responsabilidade patrimonial do empregador?
A palavra bullying tem origem no tempo inglês Bull (touro). Com o acréscimo da letra “y” surgiu o adjetivo “bully”. O adjetivo se refere aos valentões ou brigões, que normalmente estavam associados ao ambiente escolar. Ocorre que a situação se tornou tão grave, que ocasionou a edição da Lei 13.185/2015, chamada “Programa de Combate à Intimidação Sistêmica.”
A legislação prevê o cyberbullyng como uma das manifestações do bullying. Não há dúvida que as novas tecnologias, especialmente as redes sociais, têm o potencial de ampliar os efeitos do bullying. Assim, o conhecido bullying, ganha requintes de crueldade com os avanços da comunicação, determinando uma observação atenta, no que se refere as suas consequências e danos.
A definição do bullying seria uma agressão física, psicológica, verbal, moral, sexual ou virtual, praticada por uma ou mais pessoas. A agressão deve ser repetitiva e prolongada, sem motivo aparente, dificultando a defesa da vítima. Normalmente a agressão provoca doenças psíquicas, físicas e desordem pessoal ou profissional.
O fenômeno anteriormente limitado ao ambiente escolar atingiu outras esferas da interação social. No caso das relações de trabalho o fenômeno pode ser interpretado de forma lato senso, testando a responsabilidade patronal.Com efeito, é crucial que o empregador atue de forma proativa, especialmente no sentido de se precaver e manter o bom ambiente laboral. Neste ponto, sugere-se ler o artigo sobre compliance trabalhista.
O bullying ou cyberbullying na jurisprudência
Uma breve pesquisa nos repositórios de jurisprudência dos Tribunais Regionais do Trabalho demonstra que o bullying tem ensejado diversas indenizações por dano moral. Vale destacar que o fenômeno na Justiça do Trabalho é usualmente identificado como assédio moral ou assédio sexual. No entanto, a análise do conceito de bullying disposto no artigo 3º da Lei 13.185/2015, não deixa dúvidas sobre sua aplicabilidade às relações de trabalho.
Nesse sentido, decisão recente proferida pelo Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais no final do ano de 2018:
ASSÉDIO MORAL. CARACTERIZAÇÃO. O assédio moral ocorre quando uma pessoa, ou grupo de pessoas, exerce, de forma sistemática e frequente, sobre colega de trabalho, subordinado ou não, violência psicológica extrema, capaz de comprometer a higidez emocional. Referido modernamente pelo anglicismo bullying, consiste em perseguição psicológica, a qual expõe o trabalhador a situações repetitivas e prolongadas de humilhação e constrangimento. Caracteriza-se de forma ampla, mediante a reiteração de condutas abusivas, seja através de gestos, palavras, comportamentos ou atitudes, as quais atentam contra a dignidade e a integridade psíquica ou física do obreiro.
A decisão mencionada aponta todos os elementos que caracterizam um comportamento como bullying. No entanto, é importante destacar que não é qualquer comportamento que configura o assédio. É necessário que as agressões representem uma violência psicológica extrema, que comprometa a integridade do empregado.
Neste ponto, é importante destacar que o cyberbullying também se tronou comum no ambiente de trabalho. Na verdade o ambiente virtual favorece o anonimato e a impunidade do agressor, o que traz maiores desafios para o empregador. É importante, que todos os colaboradores entendam bem os impactos de suas ações, inclusive na esfera virtual. Os empregados a cada dia atuam mais no campo virtual, e precisam estar cientes que também ali há um código de ética que precisa ser seguido.
O bullying ou cyberbullying no ambiente de trabalho
O assédio moral no âmbito trabalhista, normalmente ocorre de forma vertical, ou seja, praticado por um superior hierárquico. Mas também pode ocorrer de forma ascendente, empregado em face de seu superior, ou horizontalmente, entre colegas de trabalho.
No caso do bullying prática por um superior, é possível que o empregado postule judicialmente a rescisão indireta do contrato de trabalho, prevista no artigo 483 da CLT. Embora no artigo não haja menção expressa a assédio, bullying ou cyberbullying, é possível enquadrar a conduta do agressor em várias alíneas do dispositivo.
Quanto ao bullying praticado por um colega de trabalho, ou do empregado em relação ao superior, pode ser enquadrado nas hipóteses do artigo 482 da CLT. Também neste caso, não existe menção expressa a bullying ou assédio, no entanto, é possível enquadrar a conduta em várias alíneas.
Bullying e reponsabilidade do empregador
Tendo em vista as hipóteses apresentadas, qual a responsabilidade do empregador?
Em que pese algumas situações de bullying, sejam mais difíceis de perceber, especialmente quando praticadas no ambiente virtual da empresa. O empregador pode ter sua responsabilidade atenuada, mas não isentada. Vale dizer, que o artigo 157 da CLT, determina que todo empregador deve garantir um ambiente adequado para seus colaboradores. Com efeito, atualmente, o mesmo se aplica ao ambiente virtual de trabalho.
Os artigos 927 e 186 do Código Civil, quando interpretados conjuntamente, nos deixa concluir que o empregador assume o risco do tratamento dispensado a seus empregados. Note-se que nessas hipóteses a responsabilidade do empregador é objetiva.
Ainda é importante destacar, que com a edição da Lei de Combate à Intimidação Sistemática (13.185/15), as empresas tiveram seu dever de fiscalização ampliado. A referida norma, pautada na função social da empresa, prevê o dever do empregador de promover conscientização, prevenção e combate a todo tipo de violência. O artigo 6º determina que o estabelecimento deve monitorar os casos de bullying dentro e fora do ambiente de trabalho. A empresa deve enviar relatórios mensais de planejamento de ações voltadas para o combate das práticas de bullying.
Assim, não há dúvidas da aplicação da Lei nº 13.185/15 no âmbito das relações de trabalho. É certo que a ocorrência de bullying ou cyberbullying, usualmente é nomeado como assédio moral ou sexual. No entanto, mera diferença de nomenclatura, não afasta a aplicação conjunta do disposto na Lei de Combate à Intimidação Sistemática.
Bullying e compliance
Aos gestores cabe destacar que a responsabilidade das empresas pode ser atenuada. A análise de cada caso irá determinar o grau de responsabilidade do empregador. Claro que o empregador que praticar assédio ou for omisso, deverá ser punido com severidade, inclusive de forma objetiva, conforme exposto. No entanto, a empresa que mantém setor específico e seguro que reporte de situações de bullying e que investe na qualidade do ambiente laboral, poderá ter sua responsabilidade atenuada ou excluída.
Dentro dessa realidade se torna imperiosa a criação de canais abertos de reclamação, nos quais o empregado possa denunciar de forma anônima. É necessária ainda, a existência de programas de prevenção e conscientização dos empregados e sócios sobre a importância do combate do bullying no mundo real e virtual.
As instituições têm que comprovar sua real preocupação e fiscalização com relação as situações de assedio e a qualidade mental de seus empregados. Vale lembrar, que o cyberbullying é sutil, mas deteriora o ambiente de trabalho da mesma forma. O gestor tem que agir preventivamente a fim de evitar demandas trabalhistas que irão resultar em vultosas indenizações.
Dicas práticas para evitar o minorar a responsabilidade da empresa, nos casos de assédio:
– Criar grupos de discussão sobre bullying no ambiente de trabalho;
– Criar canais de denuncia anônimos, com assessoria de profissionais especializados, como psicólogos;
– Distribuir Código de Conduta a todos os empregados mediante termo de Ciência assinado;
– Realizar treinamentos anuais acerca do conteúdo do Código de Conduta.
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